A Procuradoria Geral da República (PGR) apontou inconstitucionalidade na Lei do Transporte Zero que proíbe o transporte, comércio e armazenamento de peixes dos rios estaduais pelo período de cinco anos, a partir do dia 1º de janeiro de 2024. Em manifestação ao Supremo Tribunal Federal (STF), o órgão destaca que o houve "invasão da competência legislativa da União" e que o "Estado de Mato Grosso estabeleceu restrições excessivas e desproporcionais à pesca profissional".
"A norma impugnada apresenta restrição exacerbada, desarrazoada e desproporcional ao proibir, de maneira arbitrária, o transporte, o armazenamento e a comercialização do pescado oriundo da pesca em rios do
Estado de Mato Grosso, pelo largo período de 5 (cinco) anos" destaca trecho do documento assinado nesta sexta-feira (1) pela procuradora Elizeta Maria de Paiva Ramos.
A medida alcançaria de modo absoluto o modo de vida dos pescadores, em evidente descompasso com o princípio da dignidade da pessoa humana, a liberdade do exercício profissional e o exercício dos direitos culturais (arts. 1º, III e parágrafo único, 5º, XIII, 215 e 216 da CF), comprometendo, inclusive, a própria proteção do meio ambiente (art. 225 da CF), transgredindo o necessário equilíbrio entre desenvolvimento econômico, existência digna e proteção ambienta", completa.
A lei do Transporte zero recebeu aprovação da Assembleia Legislativa no dia 28 de junho. O governador Mauro Mendes (UB) sancionou no dia 21 do mês seguinte. O Governo defende a lei sob a justificativa de que há escassez de peixes nos rios de Mato Grosso e que, por meio desta lei, há a possibilidade de repovoamento, além de pontuar que o turismo pesqueiro através do "pesque e solte", gerará mais renda e promoverá o Estado.
Para a PGR, a argumentação da Assembleia e do Governo para defesa da lei aprovada não se sustentam. Isso porque a restrição consistente no prazo imposto mostra-se inadequada por não promover o fim almejado pelo legislador estadual.
"Não há qualquer indicativo de aumento ou redução dos estoques pesqueiros. As informações dos órgãos estaduais não trazem qualquer elemento – que tenha sido ponderado no processo legislativo ou a agora considerar – que pudesse conferir um mínimo de plausibilidade à adequação da medida alegadamente redutora dos danos ambientais, especificamente à pesca, no Estado", destaca o parecer.
Pontua, ainda, que não há informação nos autos quanto à consulta prévia realizada pelo órgão ambiental às populações tradicionais e à comunidade local afetada. "E, ainda que houvesse, não se pode concluir que fora clara quanto aos impactos do projeto de lei, haja vista que não foi realizado estudo técnico para tanto", salienta.
ADI
A ação direta de inconstitucionalidade foi ingressada pelo deputado federal Emanuel Pinheiro Neto, o Emanuelzinho (MDB-MT) no Supremo Tribunal Federal no dia 4 de outubro. Na época, o ministro do STF André Mendonça, que é relator da ação, havia determinado que ADI que contesta a lei estadual do Transporte Zero fosse remetida à análise dos 11 ministros da Corte. Ele solicitou pareceres da Advocacia-Geral da União (AGU) e da PGR. A AGU se manifestou contra a lei.
“Em face do exposto, a Procuradora-geral da República manifesta-se pelo deferimento parcial pretensão cautelar para que seja suspensa a eficácia do art. 19-A da Lei 9.096/2009, do Estado de Mato Grosso, na redação conferida pela Lei estadual 12.197/2023. Ao final, manifesta-se pela procedência parcial do pedido para que seja declarada a inconstitucionalidade do referido dispositivo legal”, completa a procuradora.